dito sobre a primavera




o tempo dos cobertores passou, o tempo dos casacos e meias passou
o tempo das janelas fechadas de frio, passou.
quando o dia esfria, cobrimos, fechamos, guardamos para esquentar
quando o dia esquenta, nos empurra para fora: nos faz abrir, tirar, refrescar
deliberadamente, buscamos o vento. dançamos com o vento.
ou, evitamos o vento, fugindo de seu abraço despenteador.
enquanto a Primavera floresce, delicadamente mostra um caminho:
- mostra-te!
não de maneira escandalosa, como fazem os girassóis.
de maneira escandalosa como fazem as borboletas.
que gosto tem o ar?
é a pergunta que parece mantrear em cada corpo.
deixam marcas na alma, as estações. deixam beijos.
quando vêm de novo, são como o velho amigo cujo abraço nos traz de volta sensações de antes
o calor faz experimentar sabores estrangeiros ao inverno, a leveza reina
é imperativo tornar-se líquido.
cômodos fechados oprimem com seu escuro alienante
a casa pede outra roupa: luz, espaço.
caixas tampadas, portas trancadas, botões abotoados, cadarços amarrados, pertences atulhados
agora, apenas lembranças claustrofóbicas de algo que não serve mais.
os tecidos dançam, as cores suavizam, o tempo não gosta dos ponteiros rijos do relógio
a pele precisa sentir-se pétala e brincar junto do azul.
os corpos pedem licença para ser apenas, tal como são
o tempo das armaduras, anuncia-se, cessou.

[texto de 24 de setembro de 2015 ]

Comentários

Postagens mais visitadas